Porque sou militar, de formação e por convicção, quase sinto vergonha de o dizer. Mas sobrepõe-se-me a honestidade intelectual e o dever de consciênca.
Um dia, há 41 anos atrás, jurei “defender a Pátria e as suas instituições ... no dever do respeito da hierarquia e da obediência aos chefes ... consagrando-me ao cumprimento do dever militar ... ainda que com o sacrifício da própria vida”.
Quando o fiz, aliás como muitos outros, foi no cumprimento de um ritual militar isento de ideologias políticas que não tinha (que muito poucos militares tinham) na altura.
Ao longo da frequência da Escola Naval, e através do contacto com militares da então Reserva Naval, já formados pelas univeridades civis e a cumprirem o serviço militar obrigatório, fui-me apercebendo da realidade do País (que de todo era a minha) e das profundas injustiças sociais que se viviam, quer na então Metrópole, quer no Ultramar, e de que todos estávamos e iríamos ser vítimas a mais ou menos curto prazo.
Depois veio o 25 de Abril (o de 1974, não outro qualquer) e tive a hipótese de escolher um dos lados da barricada que dividia Portugal.
Por convicção, arrisquei e escolhi o lado vencedor (terá sido?) e embarquei na aventura de me juntar àqueles que queriam fazer de Portugal um País melhor, democrático, evoluído, socialmente justo, com todas as condições para um futuro promissor.
Numa altura em que detínhamos o Poder por risco e mérito proprios, entregámo-lo de bandeja a políticos tão aprendizes quanto nós, mas que tinham a enorme vantagem da ambição e da ausência de escrúpulos e de dever patriótico para atingirem os seus fins.
Aos poucos, fomo-nos agachando cobardemente às ideologias interesseiras de políticos oportunistas que nunca pensaram no Povo mas apenas neles próprios, culminando na extinção do Conselho da Revolução. Tudo perante a nossa passividade.
Ingenuidade? Talvez, mas não só! Porque houve oficiais (e conheço alguns) que de "perigosos" revolucionários se conseguiram guindar a posições de topo na hierarquia das FFAA em troca da concessão das suas posições ideológicas de base. E com isto se tornaram tão oportunistas quanto os políticos profissionais.
Actualmente o que temos? Um País de rastos, à beira do colapso económico e, mais grave ainda, da crise social, sem rumo, sem perspectivas e sem esperança.
Passados 37 anos sobre a Revolução dos Cravos, resta aos incautos como eu assistirmos à reversão de valores que levou ao levantamento militar de 25 de Abril de 1974 e olharmos impávidos e serenos para a destruição do País e para o achincalhamento da Instituição Militar. Até quando?
O Povo Português está actualmente a sofrer agressões e assaltos brutais que até no tempo do António das Botas eram menos descarados. Perante os factos só resta uma pergunta: foi para isto que fizemos o 25 de Abril de 1974?
Lamento profundamente ter sido enganado na altura, e penitencio-me aqui por ter contribuído para a actual situação. Pelo facto, e pela minha quota de responsabilidade, peço desculpa a todos os Portugueses que, naquele dia, confiaram nos seus militares.
Mas, com a convicção da justiça e honorabilidade de princípios por que sempre pautei a minha postura pessoal, e agora bastante mais esclarecido politicamente, afirmo solenemente que estou totalmente disponível para reparar, em qualquer altura, os erros do passado, que também ajudei a permitir que se concretizasem.
Assim hajam mais camaradas que se sintam tão enganados e envergonhados quanto eu!
Silva Lopes